Medidas de defesa comercial, criadas para combater práticas desleais do comércio internacional que prejudicam a indústria doméstica, podem ser alteradas ou suspensas (por meio do interesse público) quando a aplicação delas for potencialmente mais danosa do que benéfica para a sociedade.
A política de Interesse Público em Defesa Comercial terá importantes mudanças a partir de 1º de janeiro de 2024. Na última sexta-feira (17), foram publicados os novos procedimentos administrativos para a condução das Avaliações de Interesse Público (AIPs), conforme a Portaria nº 282/2023 da Secretaria de Comércio Exterior (SECEX).
De maneira simplificada, as medidas de defesa comercial (antidumping, compensatória e salvaguardas) foram criadas para combater práticas desleais do comércio internacional que prejudicam a indústria doméstica de um país. Nesse sentido, o interesse público é uma prerrogativa à aplicação dessas medidas, sendo possibilitado pelos Acordos Antidumping, de Subsídios e Medida Compensatória e de Salvaguardas da Organização Mundial do Comércio (OMC). O interesse público permite que essas medidas sejam alteradas ou suspensas quando a aplicação delas for potencialmente mais danosa do que benéfica para a sociedade daquele país.
A nova Portaria é resultado da consulta pública, aberta pelo Departamento de Defesa Comercial (DECOM) no primeiro semestre de 2023, para colher subsídios sobre a condução das Avaliações de Interesse Público. Havia o entendimento, pelo DECOM e por algumas das partes interessadas, de que as AIPs demandavam elevado custo administrativo e esforço argumentativo, além de ocorrerem com frequência exagerada.
Nessa lógica, a Portaria SECEX nº 282/2023 altera o período de condução das AIPs, que ocorrerão em curto período após a conclusão das investigações de defesa comercial, assim como acontecia antes de 2020. A Portaria também permite maior flexibilidade ao governo na abertura de AIPs, que, baseadas em provas relevantes, serão realizadas apenas quando solicitadas por partes interessadas ou abertas por ofício pelo DECOM. Ademais, a Portaria cria duas modalidades de AIP (por interesse econômico-social; e por interrupção da fabricação e do fornecimento), que poderão ocorrer em situações e momentos distintos do processo.
Com essas mudanças, as Avaliações de Interesse Público passarão a ter caráter excepcional e serão focadas em elementos de considerável relevância, não mais ocorrendo na maioria das investigações de defesa comercial. A medida também permitirá que o DECOM dedique mais recursos para a condução de investigações de defesa comercial. Considerando a política de neoindustrialização do governo Lula e as tendências protecionistas do comércio global, é possível que o Brasil volte a ser relevante usuário de medidas de defesa comercial, como ocorreu a partir de 2013, para proteger sua indústria doméstica do comércio desleal internacional.
Autor:
Guilherme Gomes - Analista de Comércio Internacional do IBCI.
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