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Pontos para compreender o cenário pós-eleitoral na Argentina

Em uma eleição sem precedentes, o libertário Javier Milei (La Libertad Avanza) foi eleito presidente com 55,76% dos votos no segundo turno. Quais desafios o novo presidente enfrentará a partir de 10 de dezembro?

 

Javier Milei assumirá o cargo em 10 de dezembro, com o país enfrentando déficit fiscal de 3%, inflação de 140%, o Banco Central com reservas escassas e uma taxa de pobreza de 40%. Há expectativas de um profundo ajuste na economia para reduzir o déficit e uma desvalorização do peso. Seu plano econômico implica em cortes significativos nos gastos públicos e nos subsídios, redução de impostos para as empresas e desregulamentação. A proposta inicial de uma dolarização progressiva foi perdendo força após o cenário pós-eleitoral, no qual Milei se mostra mais moderado e sinaliza que não será abordada a curto prazo. O novo governo precisará implementar um plano consistente para obter resultados nos primeiros meses e consolidar sua permanência no poder. A sustentabilidade de seu plano dependerá de sua habilidade em lidar com conflitos sociais e da resposta de outras forças políticas. A incerteza reside na força que o futuro governo de Milei terá para essa tarefa.

Sem maioria na Câmara nem no Senado, Milei precisará moderar seu discurso disruptivo e construir uma estrutura parlamentar sólida para aprovar suas reformas, reduzindo a capacidade de veto do bloco kirchnerista. Para garantir a governabilidade, espera-se que La Libertad Avanza amplie sua base parlamentar com legisladores de Juntos por el Cambio, seus aliados políticos. No entanto, será necessário um apoio maior para bloquear um eventual processo de impeachment, por exemplo. Construir maiorias e acordos pontuais no Congresso pode levar tempo, enquanto formar um presidencialismo de coalizão seria mais eficaz. Portanto, é provável que Milei também inclua em seu governo o peronismo dissidente representado por Schiaretti e Randazzo.

O presidente eleito enfrentará grandes desafios macroeconômicos. A curto prazo, a Argentina deve realizar pagamentos de mais de 9 bilhões de dólares ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e a credores privados. O alinhamento da política externa será crucial, principalmente devido ao acesso limitado ao financiamento internacional. Milei tentará estabelecer uma relação estreita com o governo dos EUA, como demonstrado em sua viagem para buscar apoio no país. Apesar das críticas ao MERCOSUL e ao presidente Lula da Silva, espera-se que o novo presidente mantenha uma postura pragmática em função da importância das relações comerciais entre os países, como evidenciado pela experiência do governo de Jair Bolsonaro.


Nesse sentido, destaca-se que Diana Mondino, futura ministra das Relações Exteriores, viajou ao Brasil e entregou ao chanceler Mauro Vieira o convite para que Lula compareça à posse de Milei. Da mesma forma, Milei também expressou oposição às relações com a China e o BRICS, o que poderia gerar atritos devido ao acordo de swap que a Argentina assinou com o governo de Xi Jinping para dispor livremente de yuanes. No entanto, Milei agradeceu publicamente as felicitações do presidente chinês, indicando que prevalecerá o pragmatismo nas relações comerciais.

Em conclusão, a eleição de Javier Milei como presidente apresenta desafios cruciais. A efetiva implementação de um plano econômico sustentável, a capacidade de construir consensos num Congresso fragmentado e a gestão pragmática das relações internacionais serão determinantes. A visão liberal do presidente eleito pode precisar se adaptar às complexidades de governar a Argentina em crise, onde não há espaço para estratégias mais isolacionistas, como as adotadas por Bolsonaro no Brasil. Em última análise, o sucesso desta nova fase dependerá da habilidade de Milei em construir governabilidade e navegar entre suas propostas e a realidade concreta enfrentada pelo país.


Autor:

Isabel Lopez - Consultora de Análise Política da BMJ Consultores Associados

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